terça-feira, 30 de setembro de 2008

Transretrato

La mujer barbuda, de José de Ribera
O gigantismo do Museo del Prado força a sermos selectivos na sua visita sob pena de, passadas umas dezenas de quadros, nos tornarmos insensíveis à beleza e singularidade de cada um. Na minha recente visita centrei-me sobretudo nos Goyas, Velásquez e nos fantásticos Bosch, mas nenhum deles me surpreendeu tanto como este quadro de José de Ribera. A sua singularidade destaca-se no meio de tantas ascenções, paisagens e retratos de famílias reais.
Este é um daqueles quadros que merece uma leitura atenta da sua legenda. Não é bem o que parece ser. Não se trata de um homem mas sim de Magdalena Ventura amamentando o seu filho. Consta que aos 37 anos de idade surgiram-lhe, num curto espaço de tempo, barba e bigode. Teve sete filhos, três deles antes do surgimento de tão densa pilosidade. Em segundo plano surge o seu marido, Felix.
A tela foi encomendada por um duque napolitano, que desejava documentar o acontecimento e levá-lo ao rei Filipe III. José de Ribera podia ter recorrido à comicidade e ao ridículo. Pelo contrário, revelou solenidade ao retratar um caso certamente demasiado doloroso para estas duas pessoas. O seu sofrimento está bem gravado nos olhos escuros e profundos e nas suas expressões graves e silenciosas.

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